“Fiz aquele anúncio e ninguém viu / Pus em quase todo lugar / A foto mais bonita que eu fiz / Você olhando pra mim / Alto aqui do sétimo andar”
Essa música é uma armadilha emocional. Começa com a voz calma de alguém que, aparentemente, está sofrendo por amor. Parece uma canção de saudade — dessas que falam de um amor que partiu e deixou o outro tentando juntar as migalhas de lembrança. Mas O Sétimo Andar não é sobre amor. É sobre obsessão.
O narrador não apenas sente falta — ele fez anúncios. Colocou fotos dela “em quase todo lugar”. E não qualquer foto: a mais bonita, onde ela olha pra ele. Há aqui uma tentativa de congelar a realidade, de manter viva uma imagem, um momento, uma relação — mesmo que só tenha existido na cabeça dele. E é aí que começamos a perceber: ele não quer seguir em frente. Ele quer trazê-la de volta à força.
“Deus sabe o que eu quis foi te proteger / Do perigo maior que é você”
Essa frase carrega a psicose inteira. Ele se coloca no lugar de salvador, como quem sabe o que é melhor pra ela. Como se o problema não fosse ele, mas ela mesma. É o tipo de raciocínio que a obsessão cria: uma inversão de culpa. Um perigoso “eu só queria te ajudar”.
“Eu fiz aquele chá de habu / Pra te curar da tosse do chulé / Pra te botar de pé”
A imagem do chá é quase mística. Ele não só quer cuidar dela, ele quer curá-la, como um xamã, um feiticeiro, alguém com poder sobre o corpo e a alma dela. O chá é simbólico: é o que ele oferece em troca da permanência dela. Ele quer salvá-la pra que ela fique, não porque ela queira ficar. E então vem o momento mais duro:
“E foi difícil ter que te levar àquele lugar / Como é que hoje se diz? / Você não quis ficar”
Ele a levou a algum lugar. Um hospital? Um centro psiquiátrico? Um retiro? Um cativeiro emocional? Fica em aberto — e é esse o horror. Ele fala como quem fez o que precisava ser feito, como quem agiu com pesar mas por “amor”. Mas no fim, ela não quis ficar. Ela foi embora. Fugiu. Talvez escapou. E agora ele fala dela como um fantasma:
“Os poucos que viram você aqui / Me disseram que mal você não faz”
Como se ela fosse uma assombração. Como se a cidade inteira tivesse esquecido, menos ele. Ele ainda a procura, talvez ainda a espera. Mas não com ternura — com obsessão ritualística.
“Se eu numa esquina qualquer te ver / Será que você vai fugir? / Se você for, eu vou correr / Se for eu vou”
É nesse trecho que o véu cai. Ele não superou. Nunca superou. E não quer que ela tenha superado. A pergunta não é se ela vai fugir, mas se ele terá coragem de correr atrás, mesmo sabendo que já perdeu. E que, talvez, nunca teve.
O amor que sobe até o sétimo andar é o mesmo que se joga
O Sétimo Andar é uma narrativa em espiral. A música cresce como delírio, caminha entre a lembrança e a loucura. O narrador não está apenas lamentando. Ele está reconstruindo uma realidade em que ele ainda tem algum controle. É um amor que se recusa a morrer — não porque ainda existe, mas porque virou obsessão. E obsessão, como sabemos, tem sempre cara de cuidado no início. Só depois mostra os dentes.
Se no começo ele parecia um romântico desesperado, ao fim ele é só um homem à deriva, tentando segurar um fantasma pelos pulsos. E talvez, só talvez, a maior vítima da história seja ela — que fugiu, que não quis ficar, que foi chamada de perigo, mas que só queria ser livre.
E você, o que acha? Já conhecia essa música? Gostou ou gosta dela?