Se eu fosse para o céu

Nietzsche, que foi um filósofo consagrado, costumava dizer: “O fato não existe. O que existe é a versão do fato”.

Assim, dia desses, fiquei matutando: Se eu fosse para o céu, o que eu faria?

Mas será que eu mereço ir para o céu? Eu acho que sim, afinal, nunca fiz mal a ninguém, sou cumpridor das leis, bom pai, bom amigo e por aí vai. Apesar de, quando garoto, ter matado alguns passarinhos, isto é, não foram alguns, foram muitos, mas na época quase tudo era pecado, mas matar passarinhos não!

O que eu estou tentando dizer é que o fato em si e o seu conceito de pecado depende da época, do “ângulo” de quem vê e daqueles que tem o poder de julgar o que é certo ou errado. Vou esclarecer melhor:
Nietsche mini saia
Certa vez, em plena aula de religião, o padre me colocou de castigo por olhar as pernas da professora. Era época da minissaia e a professora que, diga-se de passagem, era um deslumbramento, gostava de andar na moda.

Aí eu não me contive e olhei mesmo. Se bem que, devo confessar, eu forcei um pouco a barra e deixei a régua cair para ter um ângulo melhor de visão, mas, e daí? Eu era um macho, isto é, um “machinho”, mas macho, e aquele belo par de pernas pertencia a uma bela fêmea. Portanto, o instinto natural é que me guiou. Que culpa eu tive?

Contei este episódio porque ele mostra como Nietzsche estava certo e, também, a título de comparação, ou seja, olhar as pernocas da professora era pecado, tanto que fui punido, mas nunca ninguém me criticou por matar passarinhos, pelo contrário, da mesma forma que hoje matamos os mosquitos da dengue porque são uma praga, naquela época, o excesso de pássaros destruía as plantações e era considerado uma praga.

Então, eu era uma espécie de “xerife dos sertões”, sempre com o estilingue em um bolso e a munição em outro, ou seja, um herói, não um vilão.

Bem, vamos supor que eu vá para o céu e não se fale mais nisso. A questão agora é que eu teria que passar pelo “Homem da chave”, ele mesmo: São Pedro. O dono das chaves do céu, o príncipe dos apóstolos, o primeiro papa, o protetor dos pescadores e das viúvas, o fazedor de chuvas e sei lá quantos títulos mais.

Então, como eu sou um cara precavido e terei que passar por uma entrevista com o “Homem”, tenho que conhecê-lo melhor:

Seu verdadeiro nome não era Pedro, mas Simão. Pedro vem do grego Petros (pedra) e não passa de um apelido, provavelmente vem de uma passagem bíblica quando Jesus afirmou: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja…”.

Provavelmente vem daí também seu título de primeiro papa, em que, numa passagem bíblica, ele recebeu o título de porteiro do céu, quando Jesus teria afirmado: “Eu te darei as chaves do reino dos céus”.

Ao que consta, sua morte foi mais terrível que a do próprio Cristo, pois foi crucificado de cabeça para baixo pelos soldados do imperador romano Nero, por volta do ano 67/69 da nossa era. Dizem, também, que foi enterrado onde é hoje o Vaticano.

O título de protetor dos pescadores é porque ele foi um deles, apesar de não ter sido bem um pescador. O mais correto seria dizer que ele foi um empresário da pesca, já que possuía uma frota de barcos pesqueiros.

Só não sei por que ele é também conhecido como o protetor das viúvas. Nada de pensar besteiras, apenas curiosidade, se alguém souber me conte.

Já disse que sou um cara precavido, e outra preocupação minha é: Será que tem fila para falar com o “Homem”?

Eu detesto filas! Muitas vezes, deixo de fazer alguma coisa para não ter que enfrentar uma.

Ora, minha preocupação não é nenhum absurdo, basta examinar alguns números: segundo os matemáticos, morrem por hora cerca de 6.200 pessoas, mais de 160.000 por dia e mais de 54 milhões por ano. Se é como dizem, que todos devem passar pelo crivo dele, imaginem o tamanho do seu trabalho!

Bem, vamos imaginar a melhor das hipóteses, que não vai ter fila nenhuma e o “Homem” estará me esperando sentadinho naquela poltrona de nuvem, toda branquinha, confortável e aveludada, com aquela enorme chave pendurada em sua cintura.

Então, ele vai me dizer simplesmente:

— Bem-vindo ao céu, em que posso lhe ser útil?

Aí, eu agradeceria a boa acolhida e tal, e diria:

— Sr. Pedro, se não for pedir muito, gostaria de uma audiência com o “Chefe”.

Ele, com toda certeza, me responderia:

— O “Chefe” é muito ocupado, fale comigo.

Eu, como sou meio abusado e, também, porque estou “necessitado”, insistiria:

— Sr. Pedro, com o devido respeito, devo insistir. Sem desmerecer a sua autoridade que, até onde sei, é uma espécie de subchefe, o que eu tenho a dizer é muito importante e necessita ser levado diretamente ao “Chefe”.

Vamos imaginar novamente a melhor das hipóteses, e ele, meio contrariado, vai dizer:

— Está bem, vou dar um jeito. Mas seja breve, pois, como já disse, ele é muito ocupado.

E lá vou eu, todo humilde, embaraçado e trêmulo, na presença do Todo-Poderoso, expor o meu problema:

— Senhor, insisti em lhe falar porque o meu problema é muito grave e, também, porque me disseram que o Senhor é brasileiro. Então – continuaria eu todo receoso, mas firme –, como o Senhor deve saber muito bem, a “terrinha” é maravilhosa, linda por natureza, não tem catástrofes naturais, tem espaço e terra fértil de sobra, um povo acolhedor e ordeiro, isto é, tem algumas exceções e aqueles que não gostam de trabalhar, outros são malandros etc. e tal, mas, em que pese essa dificuldade, isso não é o maior dos problemas, tanto é que, não é sobre isso que quero lhe falar…

Pois é, Senhor – continuaria, firme e esperançoso –, o grande problema da “terrinha” são os políticos! Eles estão destruindo toda essa maravilha e é sobre isso que vim lhe falar. Assim, se o Senhor é mesmo brasileiro, peço-lhe, humildemente, para iluminar a mente do nosso povo, fazendo com que tenham mais atenção ao elegerem os políticos e, se não for pedir muito, poderia nos dar uma mãozinha e ajudar a nos livrarmos dos políticos desonestos. Só isso, Senhor. Obrigado!

Será que ele vai me atender? Espero que sim, do contrário, estaremos perdidos…

Que a paz esteja com todos.

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